quinta-feira, 1 de novembro de 2007

Perdendo o gás

Ney Vilela
Hugo Chaves, meia década atrás, enfrentou uma greve de petroleiros. O fornecimento de derivados de petróleo entraria em colapso e o governo venezuelano seria derrubado, não fosse o auxílio brasileiro, por intermédio da Petrobrás. Salvamos o coronelzinho caribenho vendendo petróleo fiado e a preço de compadre. Não seria um negócio de todo ruim se Hugo Chaves cultivasse o sentimento de gratidão: mas dessa qualidade Chaves é virgem.

Tempos depois, um índio falsificado (e legítimo líder dos produtores de coca...) chamado Evo Morales chega à presidência da Bolívia. A Bolívia é um país pobre e o governo precisa de dinheiro para fazer a administração andar. Evo Morales sabe disso. Sabe, também, que há dois caminhos para se conseguir esse dinheiro: ou o país atrai investimentos estrangeiros, ou o país confisca o que já está investido em seu território.

O primeiro caminho é mais difícil (e mais vantajoso): os capitais, se investidos em atividades produtivas e sob contratos justos, acabarão por produzir empregos, renda e impostos. O segundo caminho é mais fácil: confiscando o que foi investido, o governo pode rapidamente produzir uma ação assistencialista e angariar a fidelidade do eleitorado de baixa renda. Evo Morales seguiu o segundo caminho à custa do Brasil.

Não nos cabe julgar o comportamento de chefes de Estado de outros países. Mas precisamos verificar se as ações do governo Lula da Silva foram convenientes, nesses episódios, para o Brasil. Tudo indica que o atual governo errou.

Errou ao ajudar Hugo Chaves em suas dificuldades. Se o Brasil, com prejuízos econômicos evidentes, forneceu hidrocarbonetos ao governo venezuelano, em seus momentos de dificuldades, deveríamos esperar reciprocidade. Exatamente o que não está acontecendo: a estiagem obrigou o Brasil a acionar usinas termoelétricas, o que gerou escassez de gás. A Venezuela poderia nos ajudar com grande facilidade: não o faz.

Lula da Silva errou ao aceitar as chantagens e pressões desse grande país chamado Bolívia. Evo Morales multiplicou o preço e congelou o volume de gás enviado ao Brasil. Provavelmente irá se beneficiar de nossa momentânea situação de desconforto para chantagear novos aumentos de preço.

Muitos empresários brasileiros, amparados em contratos de fornecimento de gás que cobriam mais de uma década, arriscaram-se a mudar de matriz energética: foram traídos pelo governo petista. Motoristas de taxi adaptaram seus carros ao consumo de gás e estão maldizendo sua escolha em longas filas diante dos postos de abastecimento. Tudo porque o governo misturou problemas econômicos com compromissos ideológicos e partidários, sem se preocupar com o bem-estar público.

Ou coisa ainda pior: sucumbindo à vaidade de ser aplaudido em foros internacionais e de conquistar uma improvável cadeira no Conselho de Segurança da ONU, o presidente Lula da Silva hipotecou o interesse nacional para receber tapinhas nas costas de líderes internacionais como George W. Bush ou Ban Ki-Moon. Acabou ridicularizado por Hugo Chaves e Evo Morales. Agora – que o gás acaba, o pano cai e os aplausos cessam – Lula da Silva não pode reclamar do apelido que os argentinos carinhosamente lhe conferem: Macaquito.

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