Por Heitor De Paola
Gramsci era um mestre da prestidigitação cultural, agindo mais por influência psicológica sobre a imaginação e os sentimentos do que sobre a racionalidade. Escondendo-se o verdadeiro sentido de determinadas palavras, elas ficam soltas para o imaginário popular preenchê-las com qualquer coisa ligada mais com os seus próprios desejos do que com o sentido real com que é usada pelos agentes. Como o prestidigitador que, ao chamar a atenção do público para uma das suas mãos, coloca com a outra o coelho na cartola para depois retirá-lo como se nunca tivesse sido posto lá.
Os partidos democráticos atuam segundo políticas, geralmente elaboradas com vistas a aplicação num tempo limitado, pois os mandatos são curtos e estes partidos admitem e aceitam implicitamente a alternância no poder com outros partidos democráticos adversários. Já os partidos comunistas não. Consideram os demais partidos “burgueses” não como adversários dos quais podem ganhar ou perder, mas inimigos a serem aniquilados e atuam com base em estratégias de longo prazo, pois no cerne da própria estratégia está a abolição, em algum momento no futuro, dos mecanismos “burgueses” de escolha dos dirigentes pelos eleitores. Assim, ao invés de elaborarem políticas que eventualmente podem ser revertidas se os eleitores optarem por outras, funcionam com base em estratégias de engenharia social que pretendem mudar radicalmente e para sempre a Sociedade. Mas a Sociedade terá que ser enganada até o momento em que se torne incapaz de mudar seus próprios destinos pela via eleitoral ou que esteja de tal modo encharcada de lixo marxista que já não reconheça nada diferente.
Note-se a facilidade com que, em 2002, o PT mudou o discurso radical de ontem – incluindo o início do mesmo ano – por um programa que ficou conhecido como “Lulinha, paz e amor”. Como poderia mudar outras tantas vezes quantas fossem necessárias, pois programa nada significa senão o engodo, a falsidade, por trás da qual está a estratégia de tomada de poder.
O PT se mostra tão democrático, aceitando as regras do jogo como os demais partidos, que muitos duvidam que seja um partido comunista. Dirão estes que o PT não defende nenhuma revolução e nem prega a ditadura do proletariado ou a abolição da propriedade privada. Pois quem não conhece a verdadeira história secreta dos partidos comunistas, acessíveis após as revelações de Anatoliy Golitsyn e da abertura dos arquivos secretos da URSS, desconhece que a decisão de abandonar estes termos já é velha de 47 anos. Foi tomada em 1958 pelo Politburo do PCUS para reformular a estratégia de domínio mundial, após a morte de Stalin e a queda do prestígio soviético, em parte adequando-a às sugestões do comunista italiano Antonio Gramsci.
Note-se o brutal aumento da carga tributária desde 1994, pelas mãos dos companheiros de viagem do PSDB, o crescente – e proposital! – endividamento das empresas privadas a bancos estatais aumentando de tal modo a dependência dos mesmos que já hoje os gestores da maioria delas são o BNDES, o Banco do Brasil e a CEF. Em pouco tempo, a grande maioria das empresas privadas ficará sob o controle total do governo restando aos empresários razoáveis lucros, garantidos não via concorrência mas fixados pelos órgãos estatais, com a finalidade de os tornar cúmplices da destruição de suas próprias empresas enquanto organismos decisórios independentes. Decorre também daí a proposta das Parcerias Público Privadas. Na política, o arremedo de eleições de 2002 em que três candidatos companheiros de viagem serviram como “ponto” para o candidato do partido hegemônico (PT). É exatamente isto que se chama democratismo, um arremedo de democracia. Tudo portanto dentro da já velha estratégia, dissimulada por belíssimos discursos democráticos.
Há uma imensa decepção de grande parte da população com a atual crise de corrupção que a cada dia traz novas notícias de malas de dinheiro e petistas de alto coturno envolvidos em novas e monumentais falcatruas que já atingem importantes gabinetes do Palácio do Planalto. Pois o PT não se apresentou como o partido ético por excelência? O fato é que é sim, e continua sendo o partido que mantém o monopólio da Ética no País. Não, não estou fazendo piada, falo muito sério ao afirmar que o PT sempre foi e continua sendo o único partido ético do Brasil. O grande problema é penetrar no miolo da estratégia comuno-petista para desvendar o que se entende por ética dentro dos seus planos. A população comprou o termo ética pelo seu valor de face, uma imensa tapeação, pois o verdadeiro sentido que está dissimulado na estratégia secreta é o sugerido por Gramsci. É como comprar dinheiro falso: tem toda a aparência do verdadeiro, só que não vale nada! Mas, na medida em que um grande número de pessoas deseja acreditar no seu valor e aceita transacionar com ele, ele adquire um valor que não tem.
Partindo de uma observação mais acurada da mente humana, Marx teria percebido – consciente ou inconscientemente – a preferência da Humanidade por mentiras agradáveis a ter que conviver com verdades por vezes dolorosas. Ou a um estado de dúvida, o mais temido e rechaçado de todos – embora o único que pode levar ao estudo e ao verdadeiro conhecimento. Substituiu então o velho lema socialista – a cada um de acordo com seu trabalho – por outro mais agradável - a cada um segundo suas necessidades. Enquanto o primeiro inclui necessariamente algum esforço, o segundo acena com um estado de coisas paradisíaco ou nirvânico no qual todos terão suas necessidades atendidas. A mudança é sutil mas fundamental. A recusa a pensar, a enfrentar as inevitáveis dúvidas morais que assolam sem cessar o ser humano, impede a pessoa de investigar seu interior e o mundo, e quanto mais cega se torna em relação ao mundo, mais interessada em modificá-lo à sua imagem e semelhança. Ora, é exatamente isto que Marx sugere quando dizia que os filósofos até agora cuidaram de entender o mundo, trata-se agora de modificá-lo! Modificar sem conhecer, apenas aderindo a algum tipo de opinião fácil. Que apelo seria melhor para preguiçosos mentais?
Além disto, a ideologia fornece elementos para alguns dos mais baixos sentimentos humanos:
1 - a necessidade de projetar a culpa por seus erros em bodes expiatórios, os burgueses. Particularmente na adolescência, quando o jovem está em pleno conflito com os pais;
2 - a inveja, que leva a querer destruir tudo que é admirado, inclusive a riqueza dos pais, os burgueses e a ingratidão pelo recebido deles;
3 - a vingança contra tudo e todos que sejam considerados culpados pelos infortúnios do passado;
4 - fornece belas desculpas para a maldade e a mesquinharia, tornando-as virtudes;
5 - a arrogância: sei tudo e os demais são uns burros que nada sabem;
6 - a oportunidade de compartilhar os mesmos sentimentos com um grupo unido que “pensa” igual, permitindo assim o prolongamento das “patotas” da adolescência;
7 - é um potente substitutivo pseudo-científico para as crenças religiosas “ultrapassadas”, por outra, materialista e supostamente demonstrável através de meios racionais.
Ao mesmo tempo, operando através de um splitting, uma ruptura da personalidade, permite evitar sentimentos dolorosos como a empatia com os outros e o amor ao próximo, a misericórdia, a ternura. O amor ao próximo se torna um “amor a toda a Humanidade”, desprezando os seres reais e concretos. Não há “amor ao próximo”, considerado sentimento burguês, mas amor a todos incluindo que o próximo poderá e deverá ser sacrificado em nome do todo. Há uma verdadeira e profunda inversão de valores.
Mas como estes dois sistemas incomunicáveis não conseguem ser tão estanques como desejariam, é necessária a re-afirmação constante por parte do grupo que partilha ardorosamente a mesma mentira.
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