domingo, 4 de novembro de 2007

EFEITO TROPA DE ELITE

Domingo, Novembro 04, 2007

O Efeito Tropa de Elite na sua consciência

Por Jorge Serrão

Jornalista radialista e publicitário. Editor-chefe do blog e podcast Alerta Total. Especialista em Política, Economia, Administração Pública e Assuntos Estratégicos. http://alertatotal.blogspot.com/ e http://podcast.br.inter.net/podcast/alertatotal


Na prática, uma estratégia de comunicação provoca, na opinião pública, o efeito inverso daquela intenção desejada ou prevista, originalmente, pela teoria ou ideologia formulada pelo comunicador, roteirista, marketeiro ou ideólogo. Batizamos tal fenômeno comunicativo de “Efeito Tropa de Elite”. Tal efeito ocorre toda vez que a teoria se desgraça na prática. A Teoria da Comunicação deveria catalogar o novo conceito. Terá grande utilidade para os aprendizes de ideólogos e manipuladores de consciências.

O recordista de público do cinema brasileiro (e da pirataria) entra para a história como uma ação comunicativa cuja interpretação da audiência contrariou o planejamento estratégico ou ideológico de quem concebeu a obra. O Capitão Nascimento virou herói sem querer. Existisse de verdade, o meganha de farda preta seria sério candidato a impedir o terceiro (e indesejado) mandato do Poderoso Lula. E nem precisaria usar a famosa 12... No confronto com o Nascimento, o chefão do 13 gritaria, suplicando: “Desisto! Me dá minha Kaiser!”.

Mas a estória agora é outra. E, na história o que importa é a versão. Nem sempre valem os fatos – geralmente, política e ideologicamente manipulados pelos poderosos de plantão. O cineasta José Padilha deixou clara que a intenção de seu filme era denunciar o excesso de violência, o abuso de autoridade e alguns desvios praticados pela Polícia Militar do Rio de Janeiro, na comparação com um batalhão, considerado de elite.

O filme “Tropa de Elite” foi, praticamente, uma ficção-documentário. Uma espécie de “o Bope como ele é”. A narrativa estilo Pulp-Fiction (Tempos de Violência) colaborou para criar uma identificação entre a audiência e os personagens. Toda a seqüência de imagens parecia o mundo real da violência urbana. O filme foi inspirado e baseado no tom crítico do livro “Elite da Tropa” (editora Objetiva), escrito pelo sociólogo Luiz Eduardo Soares, e por ex-integrantes do Bope, Rodrigo Pimentel e André Batista.

O Tropa de Elite desagradou a “elite” da PM. O tenente-coronel Mário Sérgio de Brito Duarte liderou o movimento contra o filme “Tropa de Elite”. Falou mais alto o sistema corporativo, já que o oficial foi comandante do Bope e atualmente exerce o cargo de confiança de Superintendente de Planejamento Operacional da Secretaria de Segurança. Além disso, Duarte é autor do livro “Incursionando no Inferno - A Verdade da Tropa”. O militar deve saber que as verdades doem. São tiros de 12 na consciência.

O corregedor interno da PM, coronel Paulo Ricardo Paúl, abriu uma investigação para apurar como se deu ou não a participação de oficiais da PM na elaboração do filme que mostra uma PM bem corrupta. O cineasta José Padilha e o ex-capitão do Bope Rodrigo Pimentel, roteirista do filme, tiveram de prestar depoimento para a responsável pelo inquérito, tenente-coronel Ana Cláudia Siciliano. Só faltou o famoso “saco plástico”. Tal sindicância tende a dar em nada. No máximo, algum PM pode ser “justiçado”. Isto é, “condenado” a trabalhar de chefe de cozinha do batalhão...

O Tropa de Elite caiu na graça da opinião pública. Mas pelo motivo inverso ao desejado por seus roteiristas. O Capitão Nascimento virou herói nacional. Sem querer! O filme acabou viabilizando a “linha Sivuca”: “Bandido bom é bandido morto”. Tropa de Elite retratou bandidos como bandidos. “Vítimas da questão social” deveriam atuar em outro filme. Em Tropa de Elite não colou o termo usado pela elite da intelectualidade para justificar a face marginal do crime. O retrato foi o mesmo no caso dos corruptos – funcionários públicos, fardados, mal pagos para zelar pela lei e pela ordem.

Os produtores do filme não contavam com a tolerância ou até o apoio da opinião pública ao excesso de violência do esquadrão do Capitão Nascimento. A reação inesperada pelos cineastas foi gerada pela leitura simplista que a sociedade faz da relação entre violência e criminalidade. O cidadão comum tem poucos elementos para saber que existe um sistema do crime organizado nos governando. Quem manda no Brasil é a associação, para fins delitivos, entre as classes política e empresarial, membros dos três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), e marginais de toda espécie, todos, unidos na parceria para usurpar o poder do Estado, praticando o roubo, a corrupção, a violência e o terror.

Existem algumas explicações para o fenômeno Tropa de Elite. Em tempos de impunidade, a opinião pública enxergou, com bons olhos, o líder de uma tropa policial que pega pesado contra os bandidos. Mesmo que seja apenas contra os “pés de chinelo” do sistema de gestão do crime organizado. O Bope não foi criado para pegar tubarão. Por mais bem intencionados e preparados que sejam seus hoje 380 integrantes, os homens de preto não foram treinados para pegar a “elite do crime”. Nem que quisessem, o sistema não deixaria. O papel deles é “enxugar o gelo” do narcovarejo. Neste caso, o combate à criminalidade é apenas aparente.

O próximo filme do José Padilha, se deixarem ele fazer, tem o título provisório de “O Corruptólogo”. A obra pretende retratar nossa classe política. Ele só não pode soltar o Capitão Nascimento no Congresso, porque será uma carnificina. Tomara que Padilha use o conceito certo de Governo do Crime Organizado. Afinal, conceituar é denominar e definir as características básicas de um dado objeto ou sujeito. A conceituação pressupõe e exige uma intencionalidade e a aplicação de um juízo de valor sobre o objeto em questão. Conceituar significa definir as características fundamentais das coisas, acontecimentos ou fenômenos.

Enquanto Tropa de Elite não vira seriado de televisão (SBT e Rede TV! negociam para transformar o filme em série), o principal mecanismo do Governo Mundial que nos controla e governa de verdade, com a ajuda do crime organizado, resolve se intrometer nos delicados assuntos da violência nacional. A ONU alega estar "alarmada" com o nível de violência e de impunidade no Brasil. Desde sexta-feira passada, escalou um especialista para investigar os assassinatos cometidos pela polícia no Brasil.

O relator para Execuções Extra-judiciais da ONU, Philip Alston, desembarco no Brasil para uma missão de onze dias pelos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco e o Distrito Federal. O resultado da investigação de Philip Alston será apresentado ao Conselho de Direitos Humanos da ONU, nos próximos meses. Desde o começo do ano, a ONU envia pedidos de explicação ao governo brasileiro sobre assassinatos e suspeitas de envolvimento de agentes de segurança pública nos crimes. A ONU reclama que nem todas as solicitações são respondidas. Seus observadores criticam nossa impunidade.

A violência é evidente. O clima é de guerra civil. Apenas no primeiro semestre do ano, os policiais civis e militares mataram 694 pessoas durante confrontos no Rio de Janeiro. Em comparação com o primeiro semestre de 2006, houve um aumento de 33,5% no total de mortos pelas polícias. O balanço é oficial. Os números são do Instituto de Segurança Pública do governo do Estado do Rio de Janeiro.

O governador Sérgio Cabral Filho já admitiu que existem células terroristas sendo combatidas no Rio de Janeiro. O curioso é que as informações sobre o terror não chegam até a sociedade, como chegam "os traumas das ações de combate da Polícia" que são acompanhadas pela mídia como se fossem “combate ao crime organizado”. A imprensa prefere ignorar o conceito de Governo do Crime Organizado (exposto parágrafos acima).

Os meios de comunicação preferem retratar as políticas de confrontos adotadas pela polícia nas favelas cariocas, e que geralmente resultam em mortos e feridos. A mídia amestrada também considera mais cômodo botar coletinhos à prova de balas em seus repórteres e cinegrafistas, para fazê-los retratar o “enxugamento de gelo” do pretenso combate ao crime. Dependendo do clima pré-eleitoral, a polícia é criticada ou elogiada pela mídia em sua ação de combate aos “pés de chinelo do crime”.

Não existe outra forma de combate ao crime, senão o confronto. O problema é: confronto contra quem? Contra pobre, preto e favelado? Contra narcovarejista que é associado e treinado por grupos terroristas ou com intenções ideológicas? Contra o Foro de São Paulo e os vários grupos narcoguerrilheiros que pretendem revolucionar a América do Sul e Caribe? Contra o Legislativo, os políticos e partidos que formam alianças ocultas com os criminosos de toda espécie? Contra o governo federal que desinveste nas Forças Armadas? Contra o Exército, a Marinha, a Aeronáutica ou a Polícia Federal que não cumprem direito a missão de defender nossas fronteiras? Contra o Judiciário que julga com rigor seletivo e colabora, com sua lentidão e ineficiência, para o sentimento de impunidade generalizada? Contra o sistema financeiro mundial que lucra alto e facilita o financiamento e a sobrevivência de várias atividades criminosas para manter as nações sob controle? Contra todos que são coniventes com o desastroso estado das coisas?

São várias indagações a serem respondidas pelos milhões de brasileiros que assistiram às versões cinematográfica ou pirata de Tropa de Elite. O grande dilema é: Como combater o verdadeiro Crime Organizado em um País cujo Estado não foi fundado pela sociedade – e sim inventado por outro Estado ibérico, cheio de vícios, burocratices, corrupções e autoritarismos? O sistema não vai combater a si mesmo. É inútil esperar que isto aconteça, por milagre.

A essa altura do campeonato, o Capitão Nascimento deve estar confuso. Seu estresse, que provoca síndromes do pânico, já deve beirar o limite do tolerável. Vamos deixá-lo descansar na paz da ficção, e partir para a ação. O confronto só precisa da escolha de um alvo preciso para começar. Se for eleito o alvo errado, continuaremos no eterno enxugamento de gelo. Se cada brasileiro começar eliminando o corrupto que existe dentro de si mesmo, já terá dado uma grande contribuição para a futura vitória contra o Verdadeiro Crime Organizado.

Experimente dar um tiro de 12 na sua consciência. É melhor do que deixar sua cara bonitinha (porém ordinária) para seu velório no enterro geral de uma Nação condenada pela História a nunca dar certo. Aperte logo o gatilho! Senta o dedo à vontade! Antes que seja tarde demais. E a terra (arrasada) lhe seja leve.


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