ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA
Lula lança amanhã no Planalto o documento "Direito à Memória e à Verdade"
Militares acusam o trabalho de repetir teses conhecidas e de ampliar ainda mais o que chamam de "indústria da indenização de criminosos"
Os militares reagiram com irritação ao livro "Direito à Memória e à Verdade", documento oficial do governo acusando o regime militar por torturas e mortes de opositores. Avaliam, segundo a Folha apurou, que o livro é extemporâneo e não tem nenhuma novidade em relação a tudo o que há anos vem sendo publicado sobre os chamados "anos de chumbo".
Os militares consideram incompreensível a decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de patrocinar o livro, assumi-lo como documento oficial e ainda fazer cerimônia no Palácio do Planalto, amanhã, para divulgá-lo.Eles acham, ainda, que a história foi contada apenas por uma das partes envolvidas, já que o seu principal responsável é o secretário de Direitos Humanos da Presidência, Paulo Vannuchi. Ele foi militante da ALN (Aliança Libertadora Nacional), principal organização da luta armada no final da década de 1960 e no início da de 1970. Foi preso durante cinco anos e torturado pelos órgãos de repressão na prisão.
Para os autores, o capítulo da Lei da Anistia, de 1979, que estendeu o benefício aos agentes da repressão, é ainda hoje questionado por setores jurídicos do país. Eles também defendem a decisão de 2004 que estendeu as indenizações devidas às famílias de mortos e desaparecidos também às dos torturados que depois se suicidaram, como Maria Auxiliadora Lara Barcellos e Massafumi Yoshinaga.
Do outro lado, os militares acusam o trabalho de ter como objetivo aumentar ainda mais o que eles chamam de "indústria da indenização de criminosos políticos".
O Planalto não convidou até ontem à noite nenhum dos três comandantes militares para o lançamento do livro, mas, se convidar, o comandante do Exército, general Enzo Martins Peri, não irá nem enviará representante. Lula e o ministro da Defesa, Nelson Jobim, estarão presentes.
Oficialmente, o general justifica que estará em Buenos Aires para uma reunião bilateral com comandos militares da Argentina. Ele viajou ontem e só volta na quinta-feira de manhã. A verdade, porém, é que o livro, com carimbo de documento do governo federal, contrariou as Forças Armadas.
A ordem do comandante é para que nenhuma declaração nem nota seja distribuída à imprensa, dentro dos princípios da disciplina e da hierarquia e da submissão ao poder político.
O Centro de Comunicação Social do Exército disse que "não se pronunciará a respeito antes do lançamento oficial".O livro está sendo lançado num momento de ajuste do Ministério da Defesa, agora sob comando de Nelson Jobim.
Os militares elogiam o estilo de Jobim, que consideram de poucas palavras, mas afirmativo e de resultados.
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