Por Ney Vilela
Coordenador regional do Instituto Teotônio VilelaPero Vaz de Caminha alertou, em sua famosa carta, D. Manoel, o venturoso: não havia especiarias em território brasileiro. O rei de Portugal concluiu que o Brasil era inútil para os cofres reais, pois o que interessava era sugar as riquezas do Novo Mundo. Se o Brasil não tinha especiarias, deveria ser deixado de lado.
D. João III, trinta anos depois, decidiu povoar produtivamente a terra brasilis. Implantou a lavoura de cana-de-açúcar para que o dinheiro proveniente das vendas de açúcar pagasse os gastos com a colonização. D. João III distribuiu lotes de terras (as sesmarias) aos membros da nobreza lusa, obrigando-os a se endividarem com os banqueiros flamengos: a Coroa não gastou um único centavo para fazer funcionar o sistema produtivo. O rei decidiu pelo uso de mão-de-obra escrava africana, o que forneceria lucros para os comerciantes (a palavra certa seria traficantes) portugueses, mesmo que isto significasse baixa produtividade e destruição de qualquer chance de fortalecimento do mercado interno brasileiro.
Antônio Rodrigues Arzão descobre ouro em 1694. Diante deste fato, o Estado português impõe uma escorchante estrutura de cobrança de impostos. O metal precioso seria utilizado para financiar a preguiça da corte portuguesa. Em resumo: durante todo o período colonial, o território e os habitantes do Brasil foram utilizados para enriquecer os governantes do Estado português.
A proclamação da Independência não alterou o apetite do Estado. A única mudança foi que os mandatários esfomeados passaram a residir no Brasil. D. Pedro I, nosso primeiro imperador, nomeava os governos provinciais, dissolvia o Congresso quando achava conveniente, destituía juízes. Enquanto afundava o Brasil em empréstimos contraídos na Inglaterra, D. Pedro I flanava nas mais variadas camas, multiplicando amantes e filhos bastardos.
A abdicação de D. Pedro I jogou o Brasil nas mãos das aristocracias rurais de Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais. Seus representantes não titubearam em cobrar impostos elevados sobre todas as atividades produtivas realizadas nas demais províncias, utilizando o dinheiro nos interesses da elite do Sudeste. O abuso foi tanto que as aristocracias rurais das demais províncias se lançaram na aventura revolucionária, quase dividindo nosso país em pequenos países miseráveis.
D. Pedro II chegou ao poder no mesmo ano em que o café se tornava o nosso principal item de exportação. Sem qualquer cerimônia, transformou o Estado brasileiro em guardião exclusivo dos interesses dos cafeicultores. Iniciou seu governo distribuindo sesmarias (agora sob a forma de suculentos lotes paulistas de terra roxa) para seus apaniguados e para os chefes do aparato repressivo do Estado. Mais tarde, o segundo imperador apadrinhou a vinda de imigrantes que seriam impiedosamente explorados pelos cafeicultores. Já encanecido, D. Pedro II ousou impedir que os cafeicultores “modernizassem” a estrutura do Estado, o que melhoraria a lucratividade das fazendas paulistas: foi derrubado.
Veio a República, mas não mudou a ação do Estado brasileiro: ao invés de servir à coletividade, o Estado se serve do povo e do território pátrio. Os cafeicultores se lambuzaram, como moscas viciadas em sangue humano, com o trabalho dos brasileiros. Além disso, cobriam as dívidas construídas pela incompetência gerencial particular com dinheiro tirado dos cofres públicos. Estas sanguessugas do erário foram extirpadas por Getúlio Vargas.
Vargas agia de maneira absolutista. Achava natural distribuir cargos públicos entre seus seguidores. Embora tenha ajudado no processo de industrialização, também criou uma estrutura de funcionários que transformou o Estado em um voraz engolidor de impostos. Os governos populistas que se seguiram transformaram o Estado num ente que distribuía riquezas, antes que elas fossem criadas. Afundaram o país em dívidas.
Os militares expulsaram os populistas, jurando que iriam moralizar o Estado. Na prática, governaram o país utilizando uma estranha mistura de autoritarismo e incompetência. Acobertaram a corrupção e gastaram dinheiro de maneira ineficiente.
A Nova República substituiu o regime militar. Nesta nova fase de governo civil, a lei de responsabilidade fiscal e o processo de privatização deram, ao cidadão brasileiro, a esperança de que o Estado se tornasse menos voraz. Esperança que durou pouco: a eleição de Lula da Silva fez com que o Brasil voltasse ao populismo engolidor de impostos. Os ministérios multiplicaram-se, como cogumelos após a tempestade. Os companheiros de partido e as lideranças sindicais incham a folha de pagamentos do funcionalismo, se aboletando nas direções das grandes empresas públicas. Ninguém se preocupa com a eficiência administrativa. Corrompe-se o funcionalismo, pois só é promovido quem é indicado por algum líder político da “base aliada”, ou quem entrega 20% dos vencimentos para o Partido dos Trabalhadores.
Assim, o Estado petista repete o Reino de Portugal, os imperadores, os oligarcas do café, populistas e ditadores militares ao viver à custa dos impostos de quem empreende e trabalha. Estado chupim.
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