sábado, 29 de setembro de 2007

AMAZÔNIA E SUA POLÊMICA

Amazônia e sua polêmica

Jarbas Passarinho
Correio Braziliense,05 Jun


Meu umbigo está na margem esquerda do rio Xapuri, em sua confluência com o rio Acre, faz 87 anos. Com quase quatro anos de idade minha família foi para Belém, onde fiz os estudos que hoje correspondem aos 1º e 2º graus. Um concurso universal, feito na Bahia, no Rio e em Porto Alegre, abriu-me as portas para a carreira militar, na Escola Preparatória de Cadetes. Concluído o curso de Estado-Maior, fui classificado na 8ª Região Militar. No estágio probatório, apresentei dois trabalhos ao Estado-Maior do Exército: Estudo geomilitar da Bacia Amazônica e Caminhos prováveis de invasão.

Os últimos 10 anos de serviço ativo, iniciei-os e os terminei no Estado-Maior da Grande Unidade, durante 10 anos seguidos e cheguei a chefe do Estado-Maior. A única função que exerci fora do Exército foi a Superintendência da Petrobras na Amazônia. Pouco depois engajei-me na luta ideológica que dividia a Guerra Fria em dois hemisférios, o comunista, da União Soviética, e o que Churchill chamava de mundo livre, liderado pelos Estados Unidos. O presidente Castello Branco, de quem fui aluno, indicou-me para substituir, em junho de 64, o governador deposto.

Faço esse preâmbulo para evidenciar minha ligação com a terra e o homem amazônicos, que estudei, antes Região Norte, depois Amazônia Legal, com partes diferentes da hiléia de Mato Grosso, Maranhão e então Goiás, hoje Tocantins, uma decisão política para desfrutar incentivos fiscais. No momento concluo um livro sobre a Amazônia, em que refaço e atualizo seus mitos e as realidades, com que convivi de perto. Provocarei polêmica, ao demonstrar os mitos e chamar atenção para a realidade que os mitos fazem ofuscar.

No passado mês de maio, o doutor em ciências sociais Marcelo Leite escreveu no Estado de S.Paulo “Bobagens amazônicas”, em que zurze uma das inteligências que mais admiro: Hélio Jaguaribe, que — no meu entender — escorregou ao associar-se à tese conspiratória que as concessões de terras indígenas, para “uma ínfima população de cerca de 200 mil índios formariam nações indígenas e subseqüentemente independentes, com o apoio americano”.

Ainda senador, fiz apresentar um requerimento de informações ao Itamaraty sobre um artigo do jurista Clóvis Ramalhete, segundo quem já teria havido uma resolução da ONU, na Bélgica, em 1993, tornando as nossas terras indígenas independentes, que em seguida seriam anexadas aos Estados Unidos. A resposta do ministro Lampreia foi clara: “Nunca houve tal resolução da ONU, que não se reúne na Bélgica, mas em Nova York. Nenhum projeto de tal natureza sequer existe e se viesse a ser apresentado, seria seguramente derrotado”.

Estamos em 1970 e o iludido jurista Ramalhete está morto e não temos nações indígenas. Eis um exemplo de mito que serve à teoria conspiratória. Mas, no Correio Braziliense de domingo 27 de maio passado, há uma entrevista, essa sim, de causar apreensão. Deu-a o general de Exército Maynard Marques de Santa Rosa, secretário de Política, Estratégica e Assuntos Internacionais do Ministério da Defesa, que denuncia a falta de controle do Brasil em relação às atividades das ONGs na Amazônia — que ele calcula em mais de 100 mil —, destinadas a ação humanística, mas também ao tráfico de drogas, de armas e até de indígenas, bem como de lavagem de dinheiro, totalmente livres do controle brasileiro, protegidas por leis brasileiras.

Nossas instituições estão impedidas de investigá-las. Escondem as fontes de financiamento, certamente externo, e “defendem interesses ocultos” a baixo custo, utilizadas para captação de informações por “organismo de inteligência estrangeiros, na espionagem para os serviços secretos do Reino Unido e dos Estados Unidos”. Disso “temos informações seguras”. Não se trata de mito alarmista, mas de caso comprovado e denunciado por autoridade absolutamente responsável, e não de quem diz que o Acre foi objeto de cobiça internacional, quando fomos nós que o compramos — não por um cavalo, no dizer do cocaleiro Morales — mas por dois milhões de libras esterlinas, no Tratado de Petrópolis.

Seriíssimo é o que revela o nobre general ao dizer ao repórter: “Há espionagem na região” visando a impedir o desenvolvimento econômico do Brasil, sob pretextos ambientalistas. Refere-se o ilustre general ao nosso “imenso banco de biodiversidade” (que é, segundo cientistas, a maior riqueza da Amazônia), mas “nada podemos fazer porque a lei não permite, a não ser por uma reforma constitucional” e na Constituinte de 1988 foi voz clamando no deserto. Eu presidia a Comissão de Defesa do Estado, na Constituinte. Tinha permanente contato com os assessores das Forças Armadas, excelentes. Nunca tive a honra de receber o general. Quanto a mudar a lei, se infraconstitucional, basta uma medida provisória a mais, pois já são milhares. Se emenda constitucional, o governo — especialmente por motivo tão nobre — a aprovará sem precisar de mensaleiros ou de fatiar os 38 ministérios.

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